Elisa Camargo




Foi em uma aventura com alguns amigos que, aos 15 anos conheci Elisa Camargo.
Fiquei por algum tempo parado em frente a ela, em silêncio observando seu rosto, seus olhos, seus longos cabelos lisos.
Elisa tinha uma boca mediana e olhos maravilhosamente negros. Seu olhar era diferente, mostrava uma serenidade que poucas vezes tinha visto.
Aquilo me encantou. 
Fiquei um bom tempo alí, parado. Sem dizer nenhuma palavra.  Apenas observando.
Enquanto meus amigos continuavam com suas aventuras, permaneci ali.
Sentia como se ela estivesse retribuindo o olhar e talvez quisesse me dizer alguma coisa. Sentia algo gostoso no ar.
Um de meus amigos me chamou. Me virei e fui em direção à ele. Mas antes, voltei e cometi um pequeno delito: Roubei sua fotografia.
Coloquei o pequeno retrato em preto e branco no bolso e fui de encontro dos meus amigos.
Fiquei a tarde toda lembrando daquela mulher. Imaginando o que ela fazia, onde morou e o porque estava alí naquele momento.
Já em casa, após tomar meu banho e jantar, fui para meu quarto. Liguei meu rádio vermelho, deitei na cama e fiquei olhando aquela fotografia.
Mil coisas passavam pela minha cabeça. Imaginei-me conversando com ela, contando as coisas que gostava de fazer e a conhecendo um pouco mais.
Com o passar do tempo, acabei dormindo. A fotografia ficou ao meu lado. 
Em algum momento de um sonho qualquer, Elisa apareceu. Estava com um vestido longo com algumas estampas e com seus longos cabelos negros soltos.
Segurou minhas mãos e disse que gostou muito da minha visita e pediu-me para ir vê-la mais vezes.
-Preciso te pedir uma coisa. Ela disse
-Pode pedir Elisa. Respondi
-Quero que amanha você volte e devolva a fotografia. Ela me disse sorrindo
-Não posso ficar com ela? Achei linda. Eu disse
-Não. preciso que devolva, pois é a única que me restou. Ela disse.
-Tudo bem, amanhã volto e deixo onde peguei. Disse
Ela sorriu e foi embora.
Na manhã seguinte fiquei com aquele sonho em mente. Era sábado e não tinha o que fazer. 
Troquei de roupa e disse pra mamãe que ia sair. Voltaria só mais tarde.  Coloquei a fotografia no bolso e saí.
O caminho até Elisa demorou 20 minutos. 
Entrei em silêncio e assim como me foi pedido, devolvi a fotografia. Pedi desculpas por ter levado e fiquei mais um pouco com ela.

As visitas se tornaram frequentes. 2 vezes por semana ia ver Elisa. Algumas vezes levava duas ou três rosas pra ela.
Mas na maioria das vezes, ficávamos em silêncio. Um olhando pro outro.
Em algumas visitas, inocentemente contava sobre minhas coisas, o que tinha feito ou o que queria fazer.
Mas quase sempre, era apenas silêncio. Puro silêncio.
Em uma dessas visitas, estava sentando no chão em silêncio quando chegou um senhor de pouco mais de 60 anos.
Ele tinha um jeito simplório e estava fumando um cigarro de palha.
-Trabalho aqui há mais de vinte anos e você é a primeira pessoa que vejo visitar essa moça. Ele disse
-Sério? Ninguém vem aqui para vê-la? Perguntei.
-Não. Uma senhora veio umas 3 vezes e depois não voltou mais. Ele me disse
-As pessoas acham que quando alguém se vai, não precisam mais serem visitadas. Mas isso é errado. É nesse momento que mais precisamos de alguém do lado. Ele me disse
-Então quer dizer que somente eu venho visita-la? Perguntei.
-Sim meu rapaz, e espero que continue. Tenho certeza que ela gosta das visitas. Ela se foi muito jovem, tinha uma vida inteira pela frente. Não é justo que ela fique sozinha assim. Ele me disse
-Imagino. Saiba que voltarei outras vezes. Disse
O velho se despediu de mim e foi continuar seus afazeres. E eu, fiquei alí com Elisa. Como sempre, em silêncio.
Após um tempo me levantei. Olhei para a fotografia e lí a mensagem na lápide: 
"Para sempre em nossos corações" 
Elisa Camargo - 19/05/1962 - 02/10/1985

Por quatro anos, visitei Elisa. Ninguém sabia dessas visitas, nem família, nem amigos. Apenas aquele velho senhor.
Me mudei pra outra cidade e nunca mais a ví. Não sei se ainda está lá.
Jamais voltei. Pode ser que algum dia eu vá até lá.
Não sei.
Espero que alguém a esteja visitando, e trazendo um pouco de calor e companhia.
Aqueles mármores são frios e sem vida. E ela gosta de receber visitas.








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